A gente não quer só comida, a gente quer comida e educação digital - Vinicius Marchese
A gente não quer só comida, a gente quer comida e educação digital

Quem me acompanha há algum tempo sabe que transformação digital é a minha principal bandeira, tanto na minha atuação profissional, como engenheiro, como presidente do CREA de São Paulo, quanto na luta política. Se existe um mecanismo que pode transformar a vida da nossa sociedade, esta ferramenta é a tecnologia e o acesso ao mundo digital. Por isso, o Brasil viveu, no início deste ano, um marco histórico, com a aprovação da Política Nacional de Educação Digital pelo atual governo brasileiro, um passo significativo para modernizar o sistema educacional do país. 

Essa lei ajudará a garantir que a tecnologia e a educação digital se tornem parte integrante do processo de aprendizado para estudantes de todas as idades e origens. Isso fará com que, a curto, médio e longo prazo, tenhamos profissionais e cidadãos bem treinados para executar as mais diferentes tarefas sociais e de trabalho.

A educação digital vem ganhando força no Brasil nos últimos anos. Em 2019, um levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) descobriu que cerca de 50% das residências brasileiras tinham acesso à internet, um aumento significativo em relação a apenas uma década antes. Esse aumento no acesso à internet levou, também, ao crescimento do uso de tecnologias digitais na sala de aula, com muitos professores agora incorporando ferramentas e recursos on-line em suas aulas.

No entanto, apesar desses avanços, ainda existem lacunas significativas no acesso à educação digital no Brasil. De acordo com um relatório do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), apenas 17% das escolas brasileiras tinham acesso à internet de alta velocidade em 2017. Essa falta de infraestrutura tornou difícil para professores e alunos aproveitar totalmente os recursos de educação digital. Quando demos de frente com a pandemia, esta realidade acabou distanciando, ainda mais, o ensino público do privado.

A Política Nacional de Educação Digital tem como objetivo abordar essas lacunas estabelecendo metas para a expansão da infraestrutura digital em escolas e faculdades em todo o país. Ela também fornece diretrizes para o desenvolvimento de materiais e ferramentas educacionais digitais, garantindo que sejam acessíveis e eficazes para todos os alunos, independentemente de sua origem socioeconômica.

Um dos principais benefícios da educação digital é sua capacidade de personalizar o aprendizado para cada aluno. Com o uso de ferramentas on-line, os alunos podem trabalhar em seu próprio ritmo, recebendo feedback e suporte individualizados conforme necessário. Esse método tem mostrado melhorar o engajamento e o desempenho dos alunos, especialmente entre aqueles que podem ter dificuldades em ambientes de sala de aula tradicionais. E aqui não estamos falando expressamente de homeschooling, mas do aperfeiçoamento e da digitalização do modelo tradicional de ensino. Ou seja, a digitalização da própria sala de aula.

Além disso, a educação digital tem o potencial de democratizar a educação, tornando-a mais acessível a estudantes que podem não ter acesso aos recursos educacionais tradicionais. Isso é particularmente importante em um país como o Brasil, onde as desigualdades socioeconômicas podem limitar as oportunidades educacionais para muitos estudantes. 

A aprovação da Política Nacional de Educação Digital é um passo crucial para garantir que todos os alunos no Brasil tenham acesso a uma educação de alta qualidade, independentemente de sua origem. Ao abraçar as tecnologias digitais na sala de aula, podemos personalizar o aprendizado e fornecer aos alunos as habilidades necessárias para ter sucesso em um mundo cada vez mais digital.

Segundo o último levantamento do IBGE, mais de 30 milhões de brasileiros não tem nenhum tipo de acesso à internet, isso representa cerca de 14% da nossa população. O número de pessoas “desconectadas” do mundo digital é o mesmo de pessoas que passavam fome no Brasil em 2022, segundo o Inquérito Nacional Sobre Segurança Alimentar no Brasil. Coincidência? Acredito que não. A exclusão social e digital são uma só, as pessoas que passam fome não só passam fome, mas não tem mecanismo algum para se conectar ao mundo. Passam fome de comida e também de informação. Esperamos que ambas as fomes: alimentar e digital cheguem ao fim em breve.  

Vinicius Marchese, engenheiro e presidente do CREA-SP.