Carrossel Caipira e os sonhos da nossa juventude - Vinicius Marchese
Carrossel Caipira e os sonhos da nossa juventude

Era uma vez um menino pobre que, aos 4 anos de idade, foi convidado para “completar o time” e jogar uma partida entre crianças num pequeno clube da sua cidade. Em um outro canto do mesmo continente, aos 11 anos de idade, um outro garoto também iniciava seus chutes na categoria de base de um time de futebol. Este é o princípio da história de Lionel Messi e Neymar Júnior, mas poderia ser a de qualquer um dos jogadores de futebol que hoje estrelam na elite do esporte no Brasil e mundo afora. Mas o que seriam deles se, nas cidades em que moravam, não tivessem um time e um campo de futebol que impulsionassem suas carreiras? O esporte transforma, mas para transformar é preciso muito mais do que paixão pela bola.

Eu nasci em Mogi Mirim, no leste paulista. Com pouco mais de 10 anos de idade, vi o time da minha cidade ser campeão da segunda divisão do Paulistão e acessar a elite do futebol do nosso estado. Mais do que isso, vi o Mogi ter a sua tática de futebol comparada à da seleção holandesa na Copa de 1974 – que acabou eliminando o Brasil. O famoso “Carrossel Caipira”, um fenômeno tático que já havia vencido o já tradicional Palmeiras e outros grandes times, permeou alguns anos no clube, que transitava entre a primeira e a segunda divisão do Campeonato Paulista.

Meu time, no interior da Baixa Mogiana, tinha um estádio não para chamar de “seu”, mas para que centenas de milhares de crianças e jovens pudessem chama-lo de seus e, ali, depositarem a esperança de um dia tornarem-se jogadores de futebol. Foi no Mogi que surgiu Rivaldo, e tantos outros. Desde 2006 o Estádio Vail Chaves, a casa do nosso querido Sapo, é alvo de uma disputa judicial.

Eu não me tornei jogador de futebol, virei engenheiro. Com 38 anos de idade, e com a experiência de quase dois mandatos como presidente do CREA-SP, conheço bem as nuances de uma disputa por um imóvel como o do Mogi. Dois caminhos miram o futuro do palco da Mancha Vermelha: o de valorização do esporte, das categorias de base, da paixão pelo time em nossa cidade e da transformação social que por meio do estádio acontece, ou o caminho da especulação imobiliária que tem poucos a lucrarem dela. E é justamente com pela primeira vertente que nós trabalhamos incansavelmente.

O esporte é a principal mola propulsora de nossas juventudes, sobretudo nas cidades do interior e nas periferias das grandes cidades. É por meio do acesso às atividades esportivas que nascem grandes talentos não só como o rosariense Lionel Messi e o mogiano Neymar Júnior, que citei no início deste artigo. Mas também a skatista do interior do Maranhão Rayssa Leal, o menino do interior do Rio que virou o Ronaldo Fenômeno, ou canoísta baiano Isaquias Queiroz. O amor pelas modalidades esportivas que praticavam contribuiu para o sucesso deles como campeões, mas o que seriam deles sem um campo, uma bola, um skate, uma canoa? O que vai ser das crianças e jovens de Mogi Mirim sem um palco do futebol onde possam sonhar uma nova possibilidade de futuro?

O Carrossel Caipira, que vi ser campeão na minha infância, consistia em todos os jogadores alternando suas posições em campo com um único objetivo: fazer gol e ganhar a partida. Funcionou para a Holanda até certo ponto da Copa de 74. Era como se todo mundo entrasse em campo para o vale tudo: deixando o adversário sem saber por onde atacar ou defender. O cuidado com o esporte é como a escalação de Vadão, em 1994: é colocar paixão onde não há esperança, é potencializar um time que não tem visibilidade. Precisamos lutar não só pelo estádio do Mogi, mas por mais estágios, mais pistas de skate, mais times bem estruturados e que possam dar às nossas juventudes oportunidade de acesso a uma nova vida. 

O Carrossel Caipira não me fez jogador de futebol, mas incentivou uma paixão na minha infância e juventude para que, hoje, eu fosse engenheiro e ocupasse lugares importantes no nosso Estado de São Paulo e para o nosso país. Hoje, aquele menino que viu o time de Vadão em campo virou a voz do estádio do Sapo e luta pelo sonho de cada criança e jovem, meninos e meninas apaixonados pelo futebol em Mogi Mirim tenham um palco, tenham um gramado, tenham um time. O Carrossel Caipira precisa colocar a nossa juventude em campo! 

Vinicius Marchese, engenheiro e presidente do CREA-SP.