O papel do digital na engenharia é presencial, não à distância - Vinicius Marchese
O papel do digital na engenharia é presencial, não à distância

Todo mundo sabe da minha paixão por tecnologia e inovação e as infinitas possibilidades que o mundo digital nos oferece. O Ensino à Distância, sem dúvida, é uma ferramenta muito importante para democratizar o acesso à educação. No entanto, o digital deve ser um dos meios, e não o único, na formação de um profissional. Na última semana, estive em Brasília e me encontrei com o presidente do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (CONFEA), Joel Krüger. Entre vários assuntos importantes, um norteou o nosso encontro: a importância de se limitar os cursos à distância na área de engenharia e agronomia. 

Recentemente, o CONFEA publicou um manifesto ao MEC para suspender a autorização de cursos nesta modalidade. O documento também foi assinado e apoiado por todos nós membros do CREA-SP. É fundamental entendermos os limites do digital na formação profissional de engenheiro e agrônomos, potencializar o uso nas áreas em que se fazem necessárias, sem abrir mão da prática em campo. É importante ressaltar que o CONFEA e o CREA-SP não estão se opondo aos cursos à distância, mas em defesa do aprimoramento da formação dos profissionais, com base no que o próprio Conselho Nacional de Educação estabelece. 

Para entender o porquê um curso de engenharia, por exemplo, não pode ser 100% à distância, elenquei alguns aspectos. O primeiro deles, a necessidade do contato direto com a prática. A formação em engenharia envolve um conjunto de conhecimentos teóricos e práticos que demandam uma interação direta entre professores, alunos e laboratórios especializados. A presença física nos espaços de aprendizagem proporciona um ambiente propício para o desenvolvimento de habilidades práticas, como a manipulação de equipamentos e a realização de experimentos. A interação presencial também favorece a troca de experiências entre os estudantes e a vivência de situações reais que simulam os desafios enfrentados no exercício da profissão. Afinal, somos seres sociais e não se forma um profissional de forma isolada, à distância, sem o contato humano e real. 

O segundo ponto é a garantia de competências técnicas e éticas: A engenharia é uma área que demanda uma formação sólida e abrangente, que vai além dos conhecimentos teóricos. Os cursos presenciais proporcionam a oportunidade de desenvolver competências técnicas e éticas fundamentais para a prática profissional responsável. O convívio com colegas e professores, a realização de projetos em equipe e a discussão de casos reais estimulam o senso crítico, a ética profissional e a capacidade de solucionar problemas complexos.

Por último ressalto que a atuação dos engenheiros envolve a responsabilidade direta pela segurança e bem-estar da sociedade. Portanto, é indispensável uma formação de qualidade que prepare esses profissionais de forma adequada. A modalidade de ensino à distância, embora possa trazer benefícios em determinadas áreas do conhecimento, não é capaz de oferecer a mesma profundidade e vivência prática necessárias para lidar com as responsabilidades inerentes à engenharia e à agronomia.

Considerando as resoluções do Conselho Nacional de Educação (CNE) e os aspectos peculiares da formação em engenharia, é essencial limitar os cursos à distância nessa área. A qualidade da formação profissional, a segurança nas atividades desempenhadas pelos engenheiros e a responsabilidade social exigem uma interação presencial que favoreça a aquisição de habilidades técnicas e éticas indispensáveis. Devemos valorizar o ensino presencial como meio efetivo de preparar engenheiros competentes, capazes de enfrentar os desafios do mercado de trabalho e contribuir para o desenvolvimento sustentável do país.

Assim como na construção de uma ponte, em que cada pedra é cuidadosamente colocada para garantir sua estabilidade, a formação profissional em engenharia e agronomia requer uma base sólida e interações presenciais. Imaginemos a formação em engenharia como a construção de uma ponte que liga o conhecimento teórico à aplicação prática. Cada aula presencial é como um tijolo, meticulosamente colocado na construção do aprendizado. A troca de experiências entre professores e alunos é a argamassa que une esses tijolos, fortalecendo o alicerce do conhecimento. O ensino à distância, por sua vez, é como tentar construir essa ponte à distância, sem a presença física e interação direta que proporcionam solidez e segurança à estrutura.

Da mesma forma com que o cultivo de uma plantação, a formação em agronomia requer um cuidado especial e proximidade com o campo. As aulas presenciais são como as raízes que absorvem o conhecimento do solo acadêmico e o transformam em práticas agrícolas eficientes. O ensino à distância seria como tentar cultivar à distância, privando-se das observações diretas, do contato com o solo fértil e das trocas de experiências com outros estudantes, professores e profissionais do campo.

É por isso que, como a construção de uma ponte requer a presença física e meticulosa colocação de cada pedra, e o cultivo de uma plantação exige a proximidade com a terra e suas nuances, a formação em engenharia e agronomia depende do encontro presencial para se desenvolver plenamente. Limitar o ensino à distância nessas áreas é uma medida que visa assegurar a qualidade, fortalecer competências técnicas e fomentar o crescimento profissional sólido. Ao preservar o valor do encontro presencial, garantimos a construção de profissionais aptos a enfrentar os desafios complexos da engenharia e da agronomia, promovendo um futuro sustentável para essas áreas tão essenciais para o desenvolvimento da sociedade.

Vinicius Marchese é engenheiro e presidente do CREA-SP.